Eloquentemente

“Portugal, gostava de te beijar muito apaixonadamente na boca”, escreve o poeta Jorge Sousa Braga, num dos textos mais patrióticos que conheço (sem ser piegas, como agora se diz por aí), insuspeitamente chamado “Portugal”. A frase deveria ser um slogan publicitário e ser escarrapachada em todas as ruas e até nas censuradas portas da Zona Velha. Deveria constar dos manuais escolares, ser explicada nas aulas de Filosofia, despida pelos professores de Português e traduzida em equação nas lições de Matemática. Deveria converter-se num remédio, num xarope para a tosse, em ampolas para o cabelo. Deveria estar impressa nos sacos de supermercado, nas garrafas de cerveja e de vinho e ser lida, diariamente, pelos apresentadores do telejornal. Deveria ser obrigatória nos discursos da direita e da esquerda e até, imagine-se, constar dos maços de cigarros. Só porque representa a antítese da vida de todos os dias. Só porque é um necessário suplemento heroico-erótico- patriótico para o único país onde se diz “só neste país”, para um país que tem de levantar a cabeça e perceber, voltando a citar o Sérgio, que “Nós somos os famosos anónimos/mesmo assim já cumprimos os mínimos/somos todos únicos/que mais vão querer de nós/para provar/quem vai à frente/ou fica atrás…”. Para um país que precisa de mandar a crise “à bardamerda”. Eloquentemente. Publicado na edição de ontem do Diário de Notícias

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