O que leva também traz

"As vias rápidas e auto estradas levam, mas também trazem". A frase foi-me dita por um professor de faculdade, como comentário a um trabalho curricular que eu apresentara sobre as então nascentes vias rápidas da Região. Argumentava eu que as ditas, tal como as auto estradas, aproximariam os centros das periferias, permitindo um desenvolvimento equilibrado e mantendo as populações nos seus locais de origem.

A resposta que recebi confundiu-me, mas reconheço-lhe toda a pertinência quando analiso, mesmo que de forma superficial, a demografia da Madeira e do país.

Apesar das vias rápidas e auto estradas, a verdade é que na Madeira a população continua a declinar perigosamente nos concelhos do norte, e em Portugal continental o interior desertifica-se de forma verdadeiramente assustadora.

Hoje, o Expresso revela que a manterem-se as actuais taxas de natalidade - e se não houver um movimento migratório a partir do litoral - o interior do país (Beiras e Trás-os-Montes), que neste momento já se encontra numa situação demográfica preocupante, perderá um terço dos habitantes em 2040 (157 mil pessoas) e 75% da população actual até 2100, o que significa que parte substancial do território ficará, literalmente, deserta.

Estes números demonstram que a política de construção de auto estradas (e grandes investimentos) em série, iniciada por Cavaco Silva e seguida por quase todos os governos posteriores, não trouxe resultados visíveis, não tendo atingido o seu principal objectivo, ou seja, contribuir para o desenvolvimento do interior do país.

A crise financeira (e económica) actual concentra todas as atenções, mas não pode, de forma alguma, ocultar outras realidades, que são tão ou mais preocupantes para o futuro do país.

Compete a esta geração de políticos, em colaboração com as universidades, com os técnicos e com os cidadãos, procurar soluções para um desenvolvimento mais harmonioso, mais sustentável, de TODO o território nacional, que beneficie TODOS os portugueses.

É óbvio que é fundamental equilibrar as finanças públicas e fazer crescer a economia, debelando a crise. Mas os problemas não se esgotam na crise dos nossos dias. É pois urgente, para bem do nosso futuro colectivo, começar a pensar estratégias que permitam inverter a queda da natalidade (problema que afecta o interior, mas também as maiores cidades do litoral, tornando a segurança social insustentável a médio prazo, por exemplo), que permitam fixar populações no interior, mas fixa-las dando-lhes qualidade de vida, que possibilitem o tal desenvolvimento harmonioso de todo o território português. Se isto não for feito, a crise repetir-se-á regularmente, de pouco valendo os actuais sacrifícios.

Parece-me imperioso lançar, desde já, um debate nacional sobre o assunto, envolvendo partidos, universidades, decisores, técnicos e os cidadãos, sobretudo aqueles que hoje vivem nos concelhos do interior e que raramente são ouvidos para o que quer que seja.

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