Indiferença



No chão está um corpo. Vivo? Morto? Não é importante. Pode estar-se morto mesmo respirando, tentando caminhar de forma trôpega, erguendo-nos para voltar a cair. À frente do corpo passa gente. Viva? Morta? É indiferente. Pode estar-se morto mesmo caminhando muito direito sobre a calçada iluminada. O corpo encolhe-se. Dobra-se ainda mais sobre si, como se fosse um corpo de um gato. O corpo tem vergonha. Quer ser invisível. Está despojado de tudo e não quer mostrar-se assim. Nu. Porque pode estar-se nu mesmo vestido. Pode estar-se nu coberto de trapos. Pode estar-se nu de fato e gravata. Mas o corpo não precisa esconder-se. Já está escondido. Naquele espaço onde todos guardamos a realidade que fingimos não ver. Ou não vemos. Porque olhando pode não se ver. Porque a indiferença é o espaço mais seguro. Para todos nós.

(Quase tão importante como combater a pobreza, é combater a indiferença).

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